terça-feira, 30 de agosto de 2011

Grã-Bretanha criminaliza manifestações da insatisfação popular (30ago2011)

London, London (Caetano Veloso)
Caetano Veloso


Problemas econômicos ou banditismo

Po Hedelberto López Blanch
Rebelión

Os grandes tumultos ocorridos em várias cidades da Grã-Bretanha na primeira metade de agosto têm, em grande parte, fundo econômico e social, e não problemas de banditismo como insistiu em catalogá-los o governo conservador do primeiro-ministro David Cameron.

Londres, Birmingham, Manchester e outras importantes cidades inglesas foram tiveram ondas de manifestantes, jovens, em sua maioria, que saíram às ruas, saquearam lojas e escritórios, com olhos postos sobre a precária situação social e econômica a que estão submetidos.

A repressão policial não se fez esperar, enquanto Cameron afirmava que não haveria nenhuma tolerância para os participantes dos distúrbios de rua.

Cerca de 3.000 manifestantes foram presos e centenas foram feridos pela fúria policial. Como um exemplo de aviso, dois jovens foram condenados a penas de quatro anos de prisão por usarem as redes sociais para incitar um motim ao qual ninguém compareceu; uma sanção que os advogados consideraram exagerada porque esse crime não implicaria nem mesmo em privação de liberdade.

Dados do Ministério da Justiça indicaram que o total de réus na Inglaterra e no País de Gales chegou ao máximo alcançado até agora: 86.654, e com as rápidas condenações dos participantes nos distúrbios pode ser gerada uma crise penitenciária de longo prazo.

Já na primeira quinzena de novembro de 2010, mais de 50.000 jovens foram às ruas da capital e uma centena deles entrou na sede do Partido Conservador para rejeitar o aumento nas matrículas iniversitárias.

Na ocasião, os jovens enfurecidos romperam janelas e entraram no átrio do vestíbulo do edifício localizado na Millibank, 30, às margens do Tâmisa, no bairro central de Westminster.

O mesmo novembro viu aparecerem inúmeras manifestações promovidas pelos sindicatos ingleses, que rejeitavam as medidas econômicas impostas pelo governo conservador dos Tories, as quais Alan Johnson, porta-voz do Partido Trabalhista qualificou como injustas e insensatas.

Embora pareça que a recente revolta foi aplacada, todos entendem que o ambiente no país está bastante tenso com possibilidades de, a qualquer momento, de ela estalar novamente.

O Prêmio Nobel de Economia, o norteamericano Joseph Stiglitz havia prognosticado, em julho de 2010, o fracasso a que levaria a aplicação dos cortes de orçamento nessa nação europeia, que passaram a vigorar em novembro daquele ano.

Stiglitz, professor de economia e finanças da Columbia Business School, disse ao jornal britânico The Independent que a proposta apresentada em junho de 2010 pelo ministro das Finanças, George Osborne, provocaria uma recessão profunda e afetaria milhões de britânicos. O tempo lhe deu razão.

Com a entrada em vigor das reduções, no estilo da mais extrema política neo-liberal, os maiores efeitos foram diretamente ao coração dos gastos públicos com graves consequências para os estratos sociais mais desfavorecidos do país.

Os cortes são radicais e chegam até a 40% dos orçamentos de alguns ministérios, por um período de cinco anos, ou seja, muito mais do que os 10% a 25% anunciados pelo chefe das finanças do governo.

Antes por essas medidas em marcha foi desencadeada uma extensa campanha de propaganda pelo Escritório de Responsabilidade Fiscal (ORF) criado pelo governo conservador.

O ORF decidiu que até 2015 a dívida acumulada estaria nos 2 bilhões de dólares e os juros a serem pagos aos credores seriam superiores a 100 bilhões de dólares anuais.

Os conservadores estão empenhados em eliminar 80 bilhões de libras de seus gastos (126 bilhões de dólares) até o fim da legislatura, em 2015, o que afeta diretamente as camadas pobres da população.

O pacote posto em marcha determina: aumento do imposto ao consumo de 17,5% para 20%; congelamento dos impostos municipais; tributar os bancos em cerca de 2 bilhões de libras; aumento de impostos sobre o capital em propriedades não empresariais tais como segundas casas; redução do subsídio à moradia; redução de 40% dos gastos de alguns Ministérios.

Redução dos subsídios sociais em 18 bilhões de libras (28 bilhões de dólares), com o que os convervadores encaminham o desmantelamento do estado de bem-estar social instaurado após a Segunda Guerra Mundial.

Com as fórmulas neoliberais em ação, o próprio Escritório de Responsabilidade Orçamentária apontou que serão perdidos 1.200.000 postos de trabalho, o que aumentará a taxa de desemprego na nação a quase 10%. Junto com isso, os subsídios aos desempregados são reduzidos a somente uma categoria de trabalho.

Com referência à educação, cada vez mais passa a ser uma possibilidade alcançavel somente pelas classes ricas da sociedade. No caso das matrículas universitárias os custos foram triplicados, pois passaram de um máximo de 2.390 libras para 9.000 libras (14.000 dólares), valor que não poderá ser pago por mais de 60% dos estudantes que não encontram trabalho e têm que depender do suporte financeiro que suas famílias lhes possam dar.

Certamente, com as medidas de autoridade impostas pelo governo de David Cameron, aumentará a taxa de desemprego, diminuirá o montante de arrecadação de impostos, reduzir-se-á a atividade econômica pela contração dos investimentos, cairá a venda no varejo à população, haverá cortes nos já débeis programas sociais, elevar-se-á a pobreza dentro da população e não haverá dinheiro suficiente para se pagar a dívida pública.

Em resumo, a culpa das revoltas que estremecera Londres e outras importantes cidades da outrora antiga primeira potência econômica e política mundial é das drásticas medidas neoliberais dentro de um sistema social cada vez mais obsoleto.

Rebelión publicou este artigo com a permissão do autor mediante uma licancça de Creative Commons, respeitando sua liberdade para publicá-lo em outras fontes.

Texto original em espanhol, postado hoje no sítio Rebelión.

Tradução: Aquiles Lazzarotto

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