sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Maurício Caleiro tem palavras que me faltaram
(31ago2012)

Logo após ter escrito e publicado minha postagem anterior, li a postagem de Maurício Caleiro em seu blog Cinema & Outras Artes. Contrariamente ao meu texto desalinhavado, ele constroi um texto que, ao fim e ao cabo, traduz bem as ideias que a falta das palavras me impediu de expressar adequadamente. Obrigado, Maurício.

A capa da Forbes


Por Maurício Caleiro

A presidente Dilma Rousseff está na capa da revista Forbes, como “terceira mulher mais poderosa do mundo”.

A Forbes é uma publicação única. Mal comparando, um cruzamento de Exame com a revista Caras – mas “de primeiro mundo”, como gostam de dizer os brasileiros colonizados. Vem sendo, há décadas, uma das principais porta-vozes editoriais do neoliberalismo, sempre defendendo o mercado financeiro contra as demandas sociais.

Mas também tem seu lado silly, mundano: como Umberto Eco e os reles mortais, gosta de fazer suas listinhas: das mais ricas, dos mais milionários, das mais poderosas e por aí vai.

Dilma ocupa a capa da Forbes justamente por representar uma relativa novidade no topo do  do ranking, mas, note-se bem, ela é “só” a terceira mais poderosa do mundo. A primeirona é a chanceler alemã Angela Merkel e a vice a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton. “Diga-me com quem anda e eu te direi quem és”, diz o ditado.

Merkel, apelidada de “a nova dama de ferro”, impõe neste momento, de forma implacável, um receituário neoliberal a países da zona do Euro em aguda crise econômica e social, deteriorando ainda mais seu quadro social ao empanturrar o doente de um remédio que está a lhe matar. O resultado é mais crise e inquietação social, com desemprego em massa em diversos países – o que tem levado, nos últimos dias, espanhóis e gregos ao desespero e ao suicídio.

Já madame Clinton conduz a política externa do país mais belicoso do mundo, que permite a tortura por afogamento como método de investigação, mantém em Guantánamo uma prisão fora dos limites da Justiça e atua atualmente em várias frentes de guerra, além de manter a Síria e o Irã no topo da agenda. Empenha-se, neste momento, em perseguir Julian Assange, por ousar divulgar fatos públicos que os meios de comunicação corporativos, sempre a soldo do poder, escondem.

Comparativamente, as realizações de Dilma, na ótica da Forbes, são bem mais modestas: permitir que os bancos que atuam no Brasil tenham os maiores lucros do mundo e que as multinacionais – inclusive as teles, que prestam um serviço de quinta - continuem a remeter bilhões de dólares ao exterior; tratar os professores e os servidores públicos na base da humilhação, da intransigência e do gás lacrimogêneo; submeter o respeito aos Direitos Humanos à pauta do desenvolvimentismo a qualquer preço - além, é claro, de promover a privatização (ops, a concessão durante décadas) de estradas, aeroportos e portos, para deleite das megacorporações "transnacionais" e dos arautos do neoliberalismo.

Muitos festejam Dilma na capa da Forbes. Inclusive aqueles que se dizem identificados com a esquerda, e que, há pouco tempo, se indignariam, com razão, se FHC (ou Sarney, ou Collor, ou Itamar ou Marina Silva) protagonizasse capas de publicações ou fosse homenageado em eventos representativos do mercado financeiro internacional – afinal, aquela seria mais uma prova de seu conservadorismo e de sua subserviência ao grande capital.

Estamos, felizmente, numa democracia, e cada um comemora o que lhe aprouver. Eu, como brasileiro e de esquerda, lamento profundamente que a presidente em quem votei perfile ao lado de tais figuras públicas, responsáveis por tanto sofrimento em diferentes partes do globo, e que ilustre uma publicação que saúda tão somente o capital e o poder – e me dou o direito de achar ridículo que pessoas que se dizem esquerdistas vibrem com uma presidente advinda de tal campo na capa da bíblia do mercado financeiro.

De minha parte, preferia uma presidente menos poderosa, mas que lutasse para fortalecer modelos alternativos ao neoliberalismo e que dispensasse a atenção prometida a Educação, Saúde, Segurança Pública e Direitos Humanos.

Ando sem palavras...
(31ago2012)

Como poderá perceber quem frequenta este blog com alguma constância, ando sem palavras. Parece-me que um recesso mental instalou-se em mim.

Há uma greve longa acontecendo, e pela primeira vez, estando eu em Cuiabá, não participo das atividades grevistas, apesar de estar em greve, é claro.

Observando "de fora" e conversando com muito poucas pessoas, vejo esvanecer-se de todo o que o Partido dos Trabalhadores já significou um dia. Um amigo meu comentou comigo que o empresário Eike Batista referiu-se à então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, como a Margareth Thatcher brasileira. Fê-lo a título de elogio, por certo.

A "nossa" Margareth Thatcher parece colar-se mais e mais à tenebrosa figura inglesa. Como pode uma liderança do Partido dos Trabalhadores tratar trabalhadores com tamanho descaso e prepotência? A opção do Partido dos Trabalhadores tem sido a de "distribuir renda" através do empresariado. É certo que boa parte do que deveria ser "distribuído" aglutinar-se-á às grandes fortunas, a título de lucro.

Servidor público não é empresário (via de regra). O servidor público é a ponta do governo que entra em contato direto com toda a população do país, prestando os cuidados e a atenção que essa população requer. Baixos salários levam à redução da qualidade dos interessados em concorrer a um emprego público. Salários baixos quebram a espinha de quem tem vontade de fazer mais e melhor sempre. Qualquer pessoa atarantada com suas contas pessoais poderá ter sua atividade laboral contaminada por seu estado de aturdimento frente às suas obrigações familiares, pessoais. Salário de servidor não engorda contas bancárias, mas sim é repassado imediatamente à economia em geral, gerando os benefícios que uma economia aquecida proporciona.

Dinheiro de servidor público não vai para contas bancárias em paraísos fiscais. As exceções devem ser casos de investigação e, se houver relação com atividades ilícitas, severa punição.

Lula é louvado em muitas partes do mundo, e fortemente pela mídia representativa dos interesses do capital.  Por quê? Como disse Júlio, um amigo, Chávez é constantemente atacado por esses mesmos meios e, entretanto, a Venezuela apresenta os melhores índices sociais da América Latina, enquanto que no Brasil quem embolsou muita "renda" foram os empresários e banqueiros. É lógico que adoram o Lula. Uma parcela mais empobrecida dos brasileiros teve, de fato, melhorias em vários aspectos de suas vidas. Com eles consegue-se muito efeito com pouco gasto.

Mas se o Brasil quiser ser, de fato, uma potência mundial, como propalado pelo PT, há que se tomar esse propósito a sério, com pesados investimentos em educação e saúde públicas. São áreas que não existem se não houver bons professores e bons profissionais de saúde engajados no trabalho.

As escolas em todos os níveis de ensino deveriam ser um celeiro de cidadãos bem formados e informados. Celeiros de criatividade em todos os campos do conhecimento. Quantos brasileiros com grande potencial intelectual e criativo não se perderam nos meandros de uma educação pública deficiente? Brasileiros que acabam se somando a uma multidão de zumbis que põem a vida a girar em torno do futebol, do emprego que pouco lhes exige intelectualmente, ou, no pior dos casos, das drogas que os desumaniza.

Seria de se esperar que o Partido dos Trabalhadores atuasse para reformular estruturalmente o país, fortalecendo a atuação dos movimentos sociais, das entidades representativas dos trabalhadores urbanos e rurais, tendo-os como base de apoio, ao invés de buscar alianças perigosas com representantes da velha elite que sempre dominou e continua dominando este país. Seria de se esperar que os servidores públicos fossem valorizados e estimulados, de forma a dar estofo e mais qualidade ao serviço público que tem distribuição capilar em todos os espaços sociais.

Quais opções teremos se o Partido dos Trabalhadores não modificou, em dez anos de poder, a velha estrutura política sob a qual continuamos vivendo. É muito bonito criar universidades, escolas técnicas, hospitais, postos de atendimento etc., mas acontece que prédios, por si sós, não fazem educação, saúde e produção de conhecimento. Prédios não resolvem os problemas do cotidiano da população que recorre aos serviços públicos. Aliás, prédios fazem a alegria de empreiteiros...

Enfim, este é mais um texto desalinhavado. Talvez porque eu tenha ficado sem palavras...

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Azenha: Governo cria "a versão do século 21 do discurso de caça aos marajás"
(28ago2012)


Reproduzido do Aldeia Gaulesa

O falso dilema entre proteger os pobres e pagar bons salários a servidores

Por Luiz Carlos Azenha

Outro dia saiu na capa do Estadão que a greve dos servidores públicos federais era uma greve de elite. Senti-me transportado à eleição presidencial de 1989, quando Fernando Collor encarnou o “caçador dos marajás”. Os marajás, obviamente, representavam o Estado brasileiro. Ao demolir os marajás, demolia-se um estado perdulário, nababesco, apodrecido. Mas, que estado tão poderoso era este, quando a Polícia Federal ainda nem tinha chegado ao Acre? Quando a rede pública de educação nem tinha chegado às fronteiras do país? Quando o SUS ainda engatinhava?

[Para informação dos mais jovens, Fernando Collor, com apoio devastador da mídia, derrotou Lula no segundo turno da primeira eleição presidencial direta depois da ditadura militar]

Obviamente, a caça aos marajás serviu à primeira encarnação do neoliberalismo no Brasil. Apeado Collor, o projeto frutificou sob Fernando Henrique Cardoso. O ataque aos marajás foi a peça pioneira na criação de um biombo simbólico, sob a qual se escondeu a vasta privatização do patrimônio público, cujo principal crime foi a venda da Companhia Vale do Rio Doce.

É natural que o Estadão continue defendendo, hoje, as mesmas teses que defendia há mais de 20 anos. O jornal é declaradamente conservador e muitas vezes elogiado justamente pela consistência.

O que de fato chama a atenção é a narrativa adotada pelo Palácio do Planalto, nos últimos dias, no que é interpretado — não sei se corretamente — como um recado da presidente Dilma aos servidores públicos federais em greve.

Tem dito a presidente que cabe a ela zelar, prioritariamente, pelos brasileiros que não têm estabilidade de emprego.

Infere-se que exista, portanto, uma competição entre os interesses dos que não dispõem de estabilidade de emprego e os interesses dos que dispõem de estabilidade.

Na minha opinião, é um falso dilema.

A estabilidade de emprego dos funcionários públicos não é, ao que eu saiba, resultado de uma concessão do governo Dilma.

Ela está escrita na lei. A estabilidade, na verdade, existe justamente para garantir que os funcionários públicos não fiquem reféns de humores políticos e partidários.

Portanto, é obrigação constitucional da presidente da República zelar pelos subordinados que dispõem de estabilidade de emprego no exercício de suas obrigações funcionais.

Que ela priorize os brasileiros que não dispõem de estabilidade, é justo e desejável.

Porém, essa prioridade não precisa ser dada às custas daqueles que dispõem de estabilidade de emprego, ou seja, do funcionalismo público.

O Estado não tem existência física, a não ser nos prédios da Esplanada dos Ministérios. Ele se materializa, entre outras coisas, nos serviços prestados pelos funcionários públicos ao povo, ou seja, àqueles que Dilma diz priorizar, os que não têm estabilidade de emprego.

Portanto, não há nada de errado em Dilma priorizar ao mesmo tempo os funcionários públicos e os que não dispõem de estabilidade no emprego. Afinal, ao valorizar os funcionários públicos estará, ainda que indiretamente, valorizando também os que recebem os serviços essenciais prestados pelos servidores do Estado.

Seria muito mais honesto que o governo dissesse claramente que enfrenta limitações orçamentárias que o impedem de dar os aumentos pretendidos pelos servidores, ao invés de jogar uns contra outros, criando a versão do século 21 do discurso de caça aos marajás.

A não ser que o objetivo seja, ainda que de forma torta ou tênue, retomar o discurso do Estado balofo, perdulário e incapaz — o discurso do neoliberalismo light.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

FBI infiltrou agentes e ajudou a organizar ataques terroristas dentro dos EUA
(23ago2012)


"Operação flexão" é forte candidata a se tornar a trama mais incompetente da história do FBI

Do Opera Mundi (20 de agosto de 2012)

Quando o FBI (Departamento Federal de Investigação) anuncia que um plano terrorista foi desmantelado em território norte-americano, como ocorreu vezes nos últimos anos, a imprensa costuma comemorar. No entanto, pouco se fala sobre como o órgão equivalente à polícia federal norte-americana consegue dar cabo destas conspirações.

O outro lado da história é simples e estarrecedor: a própria instituição infiltra agentes em comunidades islâmicas (muitas delas pacíficas) para formar e encorajar novos terroristas – frequentemente adolescentes –  planejar ataques e até mesmo fornecer os materiais para torná-los realidade.

Parece mentira, mas não é. Essas informações foram descobertas e divulgadas pelo documentário de rádio "This American Life", produzido pela Chicago Public Media e transmitido em mais de 500 estações nos Estados Unidos. O trabalho jornalístico conta a história de uma das mais desastrosas e chocantes tramas armadas pelo FBI.

Wikimedia Commons
Quartel-general do FBI em Washington

“Repetidamente, o FBI fabrica ataques terroristas”, escreve o analista Glenn Greenwald. “Eles se infiltram em comunidades muçulmanas para achar recrutas, os convencem a realizar ataques, fornecem dinheiro, armas e o know-how para levar seu plano adiante – apenas para saltar heroicamente no último instante, prender os supostos agressores que o FBI havia criado, e salvar uma grata nação de uma trama orquestrada... pelo próprio FBI”.

Denunciado

Em um desses casos, iniciado em 2006, um marginal de quinta categoria chamado Craig Monteilh foi recrutado pelo órgão para infiltrar-se numa mesquita em Orange County, na Califórnia.

Monteilh é branco, tem 1,87 metros e é musculoso como um fisiculturista. Sua missão era atrair homens da mesquita para a sua academia, onde os recrutaria para um plano terrorista com discursos sobre a jihad de Osama Bin Laden. O nome da missão: Operação Flexão.

Mas a operação encontrou uma pedra no meio do caminho: os alvos de Monteilh estavam mais interessados em jogar vídeogames do que na academia. Mesmo assim, Ayman e Yassir, os jovens que seriam aliciados pelo infiltrado marombeiro, gostaram do novato e começaram a andar com ele. Mas se assustaram quando Farouk, nome falso usado por Monteilh, começou a falar em “jihad” e “Osama Bin Laden” sempre que tinha uma oportunidade.

Nem Ayman e nem Yassir mostraram o mínimo interesse em discutir jihad ou terrorismo. Por isso, quando Monteilh começou a discutir a possibilidade de realizar um ataque à bomba, os dois jovens correram para denunciá-lo – para o próprio FBI.

O FBI negou-se a comentar a história. Principal órgão federal norte-americano de investigação, hoje o FBI está sendo processado por membros da mesquita.

E Craig Monteilh é a testemunha principal contra seus antigos empregadores.

No ano passado, a Associated Press ganhou o prêmio Pulitzer de reportagem investigativa depois de descobrir uma operação secreta de espionagem maciça da polícia de Nova York que monitorava comunidades muçulmanas da cidade, apesar de não haver evidências de atividade terrorista.

Os detalhes de alguns desses planos terroristas ganharam grande repercussão: em 2010, Mohamed Osman Mahamud planejou detonar uma bomba em um evento natalino lotado; em 2009, Hosam Maher Husein Smadi arquitetou a destruição de um arranha-céu em Dallas e Faruque Ahmed esboçou um ataque ao metrô de Washington; e em 2011, Rezwan Ferdaus foi preso depois de planejar atacar o Pentágono com aviões de controle remoto cheios de explosivos.

Seja por meio de infiltrações em mesquitas por parte do FBI ou por policiais que espionam cafés e lugares de convivência, não é de se espantar que muitos líderes muçulmanos nos EUA estejam denunciando um clima de medo e desconfiança, semeado por ineficazes – e às vezes risíveis – ações das forças de segurança norte-americanas.

Matéria veiculada na Agência Pública. Clique aqui para ler o original em inglês e aqui para ouvir o documentário de rádio do "This American Life".

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

A fernandoenriquização de Dilma
(22ago2012)


Ministério do Planejamento decide cortar ponto de servidores grevistas. Collor não fez isso. FHC tentou e chegou, sob o aconselhamento do então Advogado Geral da União, Gilmar Mendes, a desobedecer determinação judicial para que efetuasse o pagamento. FHC recuou um dia após o vencimento do prazo dado pela Justiça, e pagou os salários.

Até onde irá a nossa Presidenta?

Livro escondido pela mídia arcaica ainda é desconhecido por muita gente habitualmente bem informada
(22ago2012)



A blindagem midiática é um fenômeno impressionante no Brasil. Em muitos outros países também, mas creio que em grau menos acentuado.

Pessoas que considero bem informadas, "ligadas", surpreendem-me ao afirmarem que nunca ouviram falar no livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr. intitulado "A Privataria Tucana". É uma obra necessária para todo aquele que queira desvelar o, esse sim, "maior escândalo de todos os tempos" no Brasil: a bandalheira que foi a privatização de empresas estatais estratégicas - telecomunicações, eletricidade, siderurgia, mineração etc. - sob o comando de FHC e orquestração de José Serra. Este último, e o livro mostra documentos, locupletou-se e locupletou diversos outros personagens às custas das vendas de nossas empresas feitas a troco de muito pouco dinheiro e de muita "moeda podre", como se chamava na época a diversos papéis totalmente sem valor no mercado financeiro que foram aceitos pelo governo pelo valor de face.

Quem não quiser bancar o avestruz, que enfia a cabeça na terra para não ver o perigo, necessita urgentemente conhecer essa obra.

Abaixo apresento o vídeo da entrevista que Amaury Ribeiro Jr. concedeu a Paulo Henrique Amorim em programa da TV Record.

Como o livro, ao que parece, está esgotado, você pode baixar um pdf. Basta fazer uma busca na internet e pronto! Está tudo lá, muito bem documentado.


terça-feira, 21 de agosto de 2012

Governo dito trabalhista afronta trabalhadores e ao mesmo tempo afaga empresariado
(21ago2012)


Do sítio Escrevinhador, publicação de 17 de agosto de 2012.

“Negocia, Dilma!”

Por Pedro Pomar

A decisão do governo federal de endurecer com os funcionários públicos em greve, e abandonar a mesa de negociações, simulando conversas pontuais com uma ou outra categoria, é desastrosa qualquer que seja o desfecho da queda de braços. A assinatura de um “acordo” entre o governo e o Proifes, sindicato chapa-branca de professores federais cuja representatividade é ínfima, foi um episódio grave e deplorável de encenação. A esmagadora maioria dos docentes, representada pelo Andes-Sindicato Nacional, continua em greve no momento em que escrevo.

Como complemento de sua atitude de não negociar, o governo federal editou o decreto 7.777, que tem por objetivo substituir os funcionários em greve por trabalhadores estaduais ou municipais e até por trabalhadores “terceirizados”. Uma retomada de práticas autoritárias de governos conservadores, como o de Sarney, que também editou um decreto antigreve fracassado.

Pois bem: um dos acertos dos governos Lula foi a expansão e fortalecimento do Estado em diversas áreas, acompanhada, em certa medida, de uma ampliação do funcionalismo público federal. Foi o caso das universidades federais, por exemplo: o governo criou 14 delas, espalhadas pelo país, e precisou contratar milhares de professores qualificados. Isso era duplamente necessário, porque o Brasil vem formando a cada ano, com dinheiro público, 10 mil pesquisadores doutores, que não encontram emprego no ensino privado, nem na indústria.

O crescimento da presença do poder público é fundamental para ampliar os serviços oferecidos à população e garantir direitos. O Brasil precisa de mais auditores para combater o trabalho escravo e as burlas à legislação trabalhista, bem como para fiscalizar a arrecadação de tributos federais (como o Imposto de Renda e as contribuições patronais à Previdência e ao FGTS). Precisa de mais agentes da Polícia Federal para vigiar as fronteiras, atacar o crime organizado, o desmatamento ilegal. Precisa de mata-mosquitos para evitar a dengue. Precisa reforçar os quadros do Ministério da Saúde, da Funai, do Incra e de diversos outros órgãos públicos, porque somente assim as políticas públicas poderão tornar-se efetivas.


Desse modo, o funcionalismo precisa ser valorizado, e suas reivindicações devem ser objeto de avaliação, de negociações sérias, ainda que o governo ache impossível aceitar todas. Manter uma relação madura com o funcionalismo é, ou deveria ser, componente fundamental de uma política de valorização e consolidação do setor público. Basta ver como os jornalões começaram a soltar editoriais histéricos contra as categorias em greve. Um jornalista, colunista da rádio CBN, normalmente autor de comentários ponderados, criticou os funcionários em greve porque, entre outros motivos, eles ganham “salários relativamente bons” para os padrões do Brasil. Ele toparia revelar seu próprio salário?

Ao mesmo tempo em que joga duramente com o funcionalismo em greve, o governo acena com bondades e pacotes para a iniciativa privada, por meio de desonerações da folha de pagamento, incentivos fiscais e agora parcerias em investimentos em logística e transportes. O contraste chama atenção: sugere uma guinada. A Central Única dos Trabalhadores, que não pode ser acusada de inimiga do governo, reagiu e protocolou no Supremo  Tribunal Federal, no dia 9 de agosto, Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra o decreto 7.777, da qual também são signatárias outras entidades, de representação nacional do funcionalismo federal.

“O decreto é inconstitucional porque ele impõe restrições ao direito constitucional de greve e permite contratação na forma de convênio, o que é vedado na própria Constituição Federal. Algumas atividades são consideradas atividades típicas de Estado e não poderiam ser substituídas desta forma”, afirma o advogado Valmir Floriano. Também será protocolada denúncia na Organização Internacional do Trabalho (OIT) “contra as atitudes antisindicais do governo na tentativa de acabar com a greve legítima dos servidores públicos”, frisa a CUT.

No dia 31 de agosto termina o prazo para inclusão de emendas à Lei de Diretrizes Orçamentárias. A esta altura, portanto, as tratativas para o reajuste das diferentes categorias já deveriam estar avançadas, para que pudessem ser incluídas a tempo pelo governo, na forma de emendas. Esse limite temporal inclui um fortíssimo elemento de tensão e desgaste dos funcionários, que estão há mais de 50 dias em greve. Mais de 90, no caso dos professores universitários.

“O momento é de mobilizar cada vez mais os servidores. Se enfraquecermos a greve, estaremos condizentes com a postura do governo. Vamos para as ruas inibir qualquer atitude antigrevista do Executivo ou qualquer outro poder”, afirma o secretário de política social da CUT do Distrito Federal, Ismael César.

Pode ser que o governo vença a queda de braço. Mas ao preço de derrotar sua própria base social, direta e indiretamente.

Pedro Pomar é jornalista, editor da Revista Adusp e doutor em ciências da comunicação.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

A quem interessa impedir a implantação do VLT?
(9ago2012)

Acabo de ler no sítio HiperNotícias matéria informando que o senador Pedro Taques, defensor intransigente do projeto do BRT, teria participação atuando junto aos órgãos dos Ministérios Públicos Estadual e Federal para impedir a implantação do VLT em Cuiabá.

Já disse aqui, e infelizmente tenho que repetir, que o meu voto para esse senhor foi um engano total. Ao contribuir com sua eleição (com meu voto) eu acreditava que estaria levando ao Congresso algo novo na política, novos ares entre os nossos representantes naquela Casa. Entretanto, evidências várias vêm mostrando que ele é mais do mesmo. Com verniz constitucionalista...

Segundo a matéria citada:
Ex-procurador da República, Taques ainda mantém trânsito – e amizades – no Ministério Público Estadual e Federal, assim como na Justiça Federal em Mato Grosso. Além disso, ele sempre se posicionou contrário à implantação do VLT e defendeu, abertamente, a adoção do BRT (Bus Rapid Transit) como modal de transporte para a Copa do Mundo de 2014 na Capital.
O senador encaminhou nota em resposta à matéria afirmando não ter qualquer relação com a atitude tomada pelo Ministério Público. Disse, entre outros tópicos da nota, que acredita "na importância da construção do VLT para a população cuiabana. O que se cobra, enquanto princípio e com respaldo na Constituição da República, é que todo o processo seja acompanhado por órgãos fiscalizadores. Isso acontece em todo e qualquer país democrático em que obra ou ação dos governos utilizem o dinheiro público".

Mas como em política muita coisa acontece nos bastidores, fica para mim a dúvida. Os políticos mato-grossenses vêm, no geral, se mostrando pouco afeitos aos reais interesses da população e muito mais afeitos à obtenção do poder para seus respectivos grupos. Quem se debruça sobre o fazer político deveria fazê-lo por possuir ideais a serem conquistados em favor do coletivo, da comunidade. Entretanto, os jogos partidários costumam afastar os idealistas, trazendo à cena política representantes dos interesses do capital, de grupos empresariais (principalmente os que financiam suas campanhas).

Espero que o senador Pedro Taques venha a me surpreender positivamente. Afinal, ainda lhe restam muitos anos de mandato no Senado Federal. O tempo dirá. Os múltiplos meios de comunicação hoje disponíveis tornam os fatos políticos muito mais suscetíveis de chegarem ao conhecimento dos cidadãos. Por isso devem acautelar-se os políticos tradicionais, pois não há mais espaço para acordos e ações feitos na surdina, à sorrelfa. Sempre haverá alguém que um dia virá a vazar tais "costuras" políticas.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Eduardo Guimarães: JN dá 19 minutos à acusação do mensalão e 8 segundos à defesa
(01ago2012)

Por Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania


O colunista da Folha de São Paulo Janio de Freitas usou em artigo de sua lavra publicado na Folha de São Paulo na terça-feira (31.07) uma alegoria da qual este blog tem se valido à exaustão. Os leitores desta página identificarão a semelhança de trecho daquele artigo – trecho que reproduzo abaixo – com o que aqui tem sido dito.
“O julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal é desnecessário. Entre a insinuação mal disfarçada e a condenação explícita, a massa de reportagens e comentários lançados agora, sobre o mensalão, contém uma evidência condenatória que equivale à dispensa dos magistrados e das leis a que devem servir os seus saberes (…)”
Jânio de Freitas, O julgamento na imprensa, Folha de São Paulo, 31.07.12
Os pistoleiros pagos a peso de ouro pela mídia oligopolista para assassinarem reputações de desafetos políticos dos patrões nem poderão dizer que esse jornalista é “mensaleiro”, pois é membro do conselho editorial do jornal Folha de S. Paulo.

Frase de Freitas sobre a imprensa, imortalizada na Wikipedia, resume a razão pela qual essa imprensa está promovendo legítimo linchamento de todos os réus do mensalão indistintamente, de forma que, como bem disse o jornalista, subentende-se que o julgamento será mera formalidade para uma condenação já decidida.
“Os meios de comunicação brasileiros nunca deixaram de ser parte ativa nos esforços de conduzir o eleitorado. Sua origem e sua tradição são de ligações políticas, como agentes de facções ou partidos”
Janio de Freitas
A comprovar a opinião do eminente jornalista de que a imprensa corporativa e oligopolista atua como agente de facções e partidos está o massacre que o principal telejornal da Globo, o Jornal Nacional, está promovendo contra os réus do mensalão desde segunda-feira, quando anunciou e principiou a ocupar imenso espaço com o julgamento que começa nesta quinta-feira.

Nos primeiros dois dias desta semana, o Jornal Nacional vem entrando no ar com extensas matérias sobre o mensalão. Na segunda-feira, rememorou o caso ao longo de 11 minutos e 30 segundos; na terça, a matéria ocupou 7 minutos e 41 segundos. Desses quase vinte minutos de acusações, o telejornal contrapôs inacreditáveis 8 segundos – e só na terça-feira – à defesa de um dos réus, José Dirceu, exibindo frase de seu advogado.

À primeira vista, fica difícil afastar a sensação de que essa meia dúzia de grandes órgãos de imprensa conseguirá que o Supremo Tribunal Federal se submeta aos seus ditames e condene, sem mais delongas, todos os 38 réus por todas as acusações que lhes foram assacadas. Todavia, já surgem indícios de que a Justiça pode não compactuar com a farsa.

O indício de que assim será vem do ministro do STF José Antonio Dias Toffoli, que vem sendo questionado pela mídia por ter servido ao governo Lula e advogado para petistas assim como o ministro Gilmar Mendes serviu ao governo Fernando Henrique Cardoso e advogou para tucanos.

O caso de Gilmar é mais sério, pois, há pouco, envolveu-se em polêmica com o ex-presidente Lula ao denunciar tardiamente, após longo período da ocorrência do fato, que se encontrou com ele e que, naquele encontro, teria sofrido pressão para absolver réus do mensalão. Além disso, a atuação de Gilmar ao longo do governo Lula foi marcada por reiteradas acusações a ele.

O indício de que o STF poderá dar nos autos a resposta à pressão injusta, ilegal e antidemocrática que vem sofrendo da mídia para condenar os réus como ela quer se encontra na decisão de Toffoli de participar do julgamento do mensalão à revelia do que pregam esses órgãos de imprensa.

Aliás, vale relatar que a Folha de São Paulo questionou Toffoli e este nem lhe deu resposta. Ainda assim, é pouco. Esse é só um indício, pois outros juízes podem ceder.

O cerceamento do direito de defesa dos réus do mensalão é flagrante. A mídia tenta criar um clima de fato consumado como o que estabeleceu em outros julgamentos que não passaram de mera formalidade, mas que, ao menos, tinham contra os réus daqueles processos não politizados, como por exemplo o casal Nardoni, provas inquestionáveis, o que inexiste contra parte dos acusados pelo mensalão.

Um blogueiro da Globo chegou a escrever que o STF “apressou” o julgamento do mensalão porque o ex-presidente Lula teria criado a CPI do Cachoeira. E asseverou que não se apressa um julgamento para absolver réus. Ou seja, acusou a Corte de ter agido por motivações políticas quando seu dever é o de atuar de maneira estritamente técnica.

Como se não bastasse, a Globo e seus satélites na grande imprensa vêm tratando o ex-presidente Lula em suas reportagens como se fosse um dos indiciados. O Jornal Nacional chegou a fazer uma montagem gráfica em que uma ficha do ex-presidente sai de um arquivo de onde estavam saindo fichas dos réus de fato no inquérito do mensalão.

A mera hipótese de a Suprema Corte de Justiça do país ser encurralada para decidir como querem grupos empresariais de comunicação constitui grave ameaça à democracia. Como aceitar que empresários, por mais poderosos que sejam, possam obrigar um dos três Poderes a tirar a liberdade e a destruir a honra de cidadãos que, até prova em contrário, são inocentes?

De onde virá a resistência a esse ataque inaceitável à democracia? Quem se levantará em defesa do Estado Democrático de Direito?

Sem imprensa para dar a acusados e acusadores as mesmas oportunidades, só restam as ruas aos setores da sociedade que não aceitam que seja levado a cabo o linchamento de todos os réus do mensalão, até porque quem conhece o caso sabe que, entre os 38 acusados, há prováveis culpados, sim, mas também há prováveis inocentes.

Em 2007, nasceu neste blog a ONG Movimento dos Sem Mídia. Esse Movimento foi criado justamente por conta da pressão da mídia contra o STF evidenciada por espionagem do jornal Folha de S. Paulo contra o ministro Ricardo Lewandowsky, que o jornal relatou que disse ao telefone que a Corte que integra aceitou o inquérito do mensalão sob pressão da mídia.

Infelizmente, por ter inscrito em seu Estatuto que não se financiaria com dinheiro público, a ONG não adquiriu musculatura para enfrentar um momento como este. Não temos condição de levar às ruas mais do que algumas centenas de cidadãos.

Todavia, essas pessoas que tantas vezes já acorreram ao chamado deste blog certamente estarão dispostas a integrar esforços que envolvam outros movimentos sociais como, por exemplo, a CUT, que já declarou que irá às ruas contra a manipulação do julgamento do mensalão.

Na opinião deste blog – e de todos os mais de 500 filiados ao Movimento dos Sem Mídia –, não há mais o que esperar. A manipulação já está ocorrendo. A imprensa oligopolista que age a serviço de facções, como diz Janio de Freitas, está promovendo um linchamento, retirando dos acusados pelo mensalão, indistintamente, o direito de defesa.

Custará muito caro ao país e a todos os que anseiam pela continuidade de seu soerguimento do buraco em que foi atirado pela direita demo-tucano-midiática a inação diante dessa barbaridade que está entrando todos os dias em nossas casas através de concessões públicas de televisão aberta.

Mesmo que os agentes de facções políticas citados por Janio de Freitas não atinjam seus objetivos eleitorais, assim como foi em 2006 e em 2010, condenar cidadãos brasileiros só porque meia dúzia de donos de jornais, revistas e televisões querem fará este país retroagir séculos, institucionalmente.

Para concluir, este blog exorta a todos os que entendem a gravidade do momento que vive o país a não se acomodarem e a se engajarem na resistência à mídia. A injustiça que se pretende fazer a alguns é ameaça que está sendo feita a todos, inclusive àqueles que querem conseguir na Justiça o que não conseguiram nas urnas.

Às ruas, brasileiros!