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Geólogo e professor aposentado, trabalho este espaço como se participasse da confecção de um imenso tapete persa. Cada blogueiro e cada sitiante vai fazendo o seu pedaço. A minha parte vai contando de mim e de como vejo as coisas. Quando me afasto para ver em perspectiva, aprendo mais de mim, com todas as partes juntas. Cada detalhe é parte de um todo que se reconstitui e se metamorfoseia a cada momento do fazer. Ver, rever, refletir, fazer, pensar, mudar, fazer diferente... Não necessariamente melhor, mas diferente, para refazer e rever e refletir e... Ninguém sabe para onde isso leva, mas sei que não estou parado e que não tenho medo de colaborar com umas quadrículas na tecedura desse multifacetado tapete de incontáveis parceiros tapeceiros mundo afora.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Morreu José Vasconcelos, e nosso humorismo ficou mais pobre (12out2011)

Italiano que assiste uma partida de futebol pela primeira vez
José Vasconcelos - "Eu sou o espetáculo" - 1960


Aos 85 anos, morreu ontem o artista e comediante José Vasconcelos.

Seus discos de pioneiro no que agora se chama stand-up, e então se conhecia como showman, ou algo parecido, me levaram muitas vezes (e ainda levam) às gargalhadas. Seu humor não se parecia nem de longe com o tipo de humor hoje desenvolvido pelos comediantes de stand-up.

José Vasconcelos fazia imitações e criava enquetes extremamente engraçadas sobre situações cotidianas, sem, ao que eu me lembre, se fazer em cima de minorias ou de visões preconceituosas.

Sua imitação de um improvável locutor gago, ou dos atores hollywoodianos, bem como de locutores famosos dos noticiários de cinema ou de rádio, além da irretocável imitação de Ary Barroso em toda a sua carga de mau-humor, tudo isso me traz um sorriso à face com a mera lembrança de um ou outro detalhe.

Hoje está difícil termos humor nessa perspectiva. Há tempos, um amigo intelectual com quem eu conversava em Brasília disse-me que tinha preconceito contra o programa infantil do Chaves. O programa parecia-lhe ridículo, ruim e mais alguns outros objetivos desfavoráveis. E ele nunca tinha assistido de fato a nenhum dos episódios do programa.

Num belo dia, em que ele ficou com os filhos pequenos (coisas de pais divorciados) e não pôde sair para passear por causa de uma forte chuva, as crianças pediram que ele ligasse a televisão porque elas queriam ver o Chaves. Ele, indignado ante a baixa exigência intelectual de seus filhos, mas disposto a não criar conflito com eles, ligou a televisão tal como lhe foi pedido. Sua disposição era aproveitar a oportunidade para demonstrar às crianças quanta bobagem haveria no programa.

Surpreendentemente, ele foi sendo cativado pelos enquetes, pelas historietas. Não conseguia encontrar nenhuma malícia ou referência preconceituosa (tipo das que eram frequentes nos programas dos Trapalhões, da Rede Globo). Meu amigo foi percebendo que os redatores do programa realmente adentravam o mundo e o imaginário das crianças, sem acrescentar-lhes qualquer "molho" adulto. Ali estavam a singeleza e a falta de malícia que caracterizavam as crianças, pelo menos as crianças de algumas décadas atrás.

Pronto! Meu amigo ficou fã do programa, inclusive assistindo-o e se divertindo com ele mesmo quando não estava com seus filhos.

José Vasconcelos caminhava por aí. Adulto, sim, em suas enquetes. Mas sem alusões maliciosas, sem apelações para o fácil espaço dos preconceitos ou da ridicularização de minorias sexuais, raciais etc. Sem a malícia da sensualidade gratuita e de mau gosto. Era um artista cuja plateia podia era composta majoritariamente por adultos. Eram, tempos em que as crianças não participavam de shows teatrais noturnos. Entretanto, se qualquer criança estivesse assistindo a um de seus shows, ela não sairia dele com seu imaginário infantil conspurcado. Era um humor para adultos, mas com a leveza e a graça acessíveis a crianças.

Hoje isso está ficando difícil. Vejo crianças acessando vídeos de humoristas na internet, e esses vídeos são lamentáveis por seus conteúdos, apesar de conterem o inesperado que produz o riso. Mas o riso é, ou deveria ser, culpado, envergonhado.

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