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Geólogo e professor aposentado, trabalho este espaço como se participasse da confecção de um imenso tapete persa. Cada blogueiro e cada sitiante vai fazendo o seu pedaço. A minha parte vai contando de mim e de como vejo as coisas. Quando me afasto para ver em perspectiva, aprendo mais de mim, com todas as partes juntas. Cada detalhe é parte de um todo que se reconstitui e se metamorfoseia a cada momento do fazer. Ver, rever, refletir, fazer, pensar, mudar, fazer diferente... Não necessariamente melhor, mas diferente, para refazer e rever e refletir e... Ninguém sabe para onde isso leva, mas sei que não estou parado e que não tenho medo de colaborar com umas quadrículas na tecedura desse multifacetado tapete de incontáveis parceiros tapeceiros mundo afora.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Crise do capitalismo e o "caminho até a servidão" (27jun2011)

Está no blog Nebulosa.de.Órion, postado em 17 de junho de 2011.

Por Alberto Rabilotta
ALAI AMLATINA

O presidente Barack Obama adverte que outra crise financeira global pode desatar-se se o Congresso de Washington não elevar o "teto" da dívida pública... O economista Nouriel Roubini, que antecipou a crise financeira de 2007-2009 afirma em Singapura (Bloomberg News) que a economia global enfrentará uma "tempestade perfeita" em 2013 por causa da dívida pública nos Estados Unidos, a reestruturação da dívida em vários países da União Europeia, uma desaceleração da economia chinesa e o estancamento da economia nipônica.

Enquanto isso, segundo Roubini, na segunda metade de 2011 a expansão econômica sofrerá uma desaceleração. Outro economista que antecipou a crise financeira global, Stephen Roach da Morgan Stanley Asia, disse em Shangai que devido à debilidade da recuperação o mundo enfrentará vários anos de "sustos pelo crescimento". Nas declarações a Bloomberg Televisión o economista da Morgan Stanley só contradisse a Roubini no tocante a China, de onde -segundo Roach- os funcionários tem uma "estratégia clara" para dar a virada até um modelo de crescimento baseado no consumo doméstico e estão alertas à ameaça que apresenta a inflação, mas enfatizou que estando o mundo industrializado em um período de débil crescimento não se dispõe de uma retaguarda que permita enfrentar as sacudidas periódicas que surgem e golpeiam as economias específicas no mundo. Com os preços do petróleo que sobem, a zona do euro com problemas, com outra queda no mercado residencial nos Estados Unidos e os problemas do Japão, certamente que estamos tendo mais sacudidas que me períodos normais, segundo Roach.

A ditadura do capital financeiro

Este estado quase permanente de crise, porque é disto que se trata, está servindo muito bem (*) ao setor financeiro dominante, Wall Street, Londres e os grandes bancos da Alemanha e França, para consolidar seu poder sobre todo o sistema, como escreve o professor de economia Michael Hudson (1) em CounterPunch, que sublinha que os estrategistas financeiros não deixarão passar a oportunidade que essa crise os brinda.

E escreve que para estes financistas chegou o momento de privar aos devedores de seus direitos e que isto constitui uma revolução, ou melhor dito uma contra-revolução para eliminar todo o ganho no século 20 em matéria de democracia social, pensões e seguridade social, o setor público para serviços médicos, e outras infraestruturas que proveem os serviços essenciais gratuitamente ou a preços subsidiados. O modelo básico que os financistas querem executar são as reformas neoliberais aplicadas à ex-União Soviética a partir de 1991: privatização das empresas públicas, uma reforma fiscal regressiva, a desregulação da economia, de preços, condições trabalhistas e término do crédito. Em resumo, segundo Hudson, o objetivo da atual oligarquia financeira é "concentrar a riqueza na cúspide da pirâmide (2) e baixar os salários, porque as finanças amam os baixos salários".

O trabalho de Hudson é importante porque define o "objetivo das finanças" como uma "arrebatada de bens", uma busca de converter a infraestrutura pública em "pedágios" para a extração de uma renda da economia, o "almoço gratuito", enquanto desmantelam os sindicatos de trabalhadores e baixam os salários. Mas, acrescenta, para conseguir este objetivo - que é bem visível no caso da Grécia, com o Banco Central Europeu (BCE) e o FMI exigindo que esse país ceda as jóias de sua infraestrutura pública para o setor financeiro estrangeiro para cancelar a dívida nos bancos alemães e franceses -, o setor financeiro necessita apropriar-se do poder político para substituir a democracia com tecnocratas financeiros cujo papel será fingir que não há contra-revolução alguma, mas um aumento da `eficiência', da `criação de riqueza' mediante a ordenha da economia com o objetivo final de que "todo o excedente  sirva para ser pago como juros aos gerentes financeiros que estão emergindo como os novos planificadores centrais da civilização ocidental".

E esta receita que faz com que os governos sejam responsáveis pelas dívidas do setor privado ou a dívida pública incorrida para salvar o sistema financeiro da crise de 2008, conclui Hudson, põe em dúvida a soberania mesma dos países. E sendo este o objetivo da guerra que está sendo travada contra a Grécia pelo BCE e pelo FMI, seria conveniente ver o caso da Grécia como um ensaio do que se aplicará não somente para o resto da Europa, mas também para o que os cabidelistas financeiros quiseram aplicar nos Estados Unidos.

A revolução na agenda do dia

Com as dezenas de milhares de indignados nas praças da Espanha, as manifestações cotidianas populares na Grécia para impedir a entrega do país aos bandidos das finanças, os banqueiros da Alemanha, França, Londres e Wall Street, e uma surda cólera fermentando na juventude europeia pela falta de perspectivas trabalhistas no final de longos estudos, e na sociedade em geral pelo desemprego, a exclusão e a precariedade trabalhista, pelo empobrecimento dos aposentados e a baixa do nível de vida da classe média, entre muitas coisas que apontam ao que Hudson define como uma contra-revolução para eliminar tudo o que se ganhou no século 20 em termos sócio-econômicos e fazer-nos voltar ao regime de servidão.

Mas o desenvolvimento do sistema capitalista até esta predominância do sistema financeiro, até esta "ditadura do capital financeiro" e o retorno a um sistema rentista de exploração até a morte, é assim mesmo uma indicação de que as economias capitalistas mais desenvolvidas estão "prenhas" de gravíssimas contradições, que tomara estejam gestando o que Karl Marx definia em seus (muito pouco lidos e menos estudados) Grundisse - os dois tomos de "Elementos Fundamentais para a Crítica da Economia Política" (3) - como "contradição fundamental", ou o "como e quando se derrubará a ordem social capitalista".

Se a contra-revolução está em marcha é quiçá porque começam a existir condições objetivas para uma revolução. E esse será o tema do segundo artigo.

La Vèrdiere, Francia.

Notas:

(*) Constitui parte do que Naomi Klein elabora mui justamente em seu livro “A doutrina do Shock”. (O vídeo sobre "A doutrina do choque" postei aqui - Aquiles).

(1) Michael Hudson, The financial Road to Serfdom; How Bankers are Using the Debt Crisis to Roll Back the Progressive Era http://www.counterpunch.org/hudson06032011.html

(2) Sobre esta concentração da riqueza no topo da pirâmide e o processo de pauperização nos Estados Unidos ver o excelente trabalho -baseado em estatísticas- do professor de sociologia William Domhoff, da Universidad de California em Santa Cruz, no portal Who Rules América? http://sociology.ucsc.edu/whorulesamerica/power/wealth.html

(3) Grundisse, Elementos Fundamentais para a Crítica da Economía Política, Edición Siglo XXI Editores, 1971, com uma excelente introdução de Martín Nicolaus.

Vejam o texto original em rebelion.org

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