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Geólogo e professor aposentado, trabalho este espaço como se participasse da confecção de um imenso tapete persa. Cada blogueiro e cada sitiante vai fazendo o seu pedaço. A minha parte vai contando de mim e de como vejo as coisas. Quando me afasto para ver em perspectiva, aprendo mais de mim, com todas as partes juntas. Cada detalhe é parte de um todo que se reconstitui e se metamorfoseia a cada momento do fazer. Ver, rever, refletir, fazer, pensar, mudar, fazer diferente... Não necessariamente melhor, mas diferente, para refazer e rever e refletir e... Ninguém sabe para onde isso leva, mas sei que não estou parado e que não tenho medo de colaborar com umas quadrículas na tecedura desse multifacetado tapete de incontáveis parceiros tapeceiros mundo afora.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Projeto de lei da AL de SP proíbe venda e consumo de álcool nos espaços abertos, como as praias, por exemplo (7mar2012)

Escalada de proibições e obscurantismo avança no Brasil

Por Edu Maretti, no blog Fatos etc.

Estamos realmente entrando em uma escalada autoritária, moralista e obscurantista cujo fim não se pode prever. Na esteira de uma proibição, vem sempre outra, e outra, e outra. Quando os incautos, ingênuos e ignorantes percebem, eles mesmos começam a ser vítimas dos tentáculos do polvo que antes defenderam.

Depois da proibição do fumo, que muita gente apoiou, embora proibir seja sempre o caminho mais perigoso, agora a Assembleia Legislativa de São Paulo se sente à vontade e deve apresentar esta semana um novo projeto, desta vez para proibir a venda e consumo de álcool nos espaços abertos. O projeto é de autoria de Campos Machado (PTB). Se aprovado e sancionado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), segundo a Agência Estado, “ficarão proibidos a venda e o consumo de bebida alcoólica em ambientes públicos, como praias, calçadas, postos de gasolina e estádios, entre outros lugares”.

E mais: “Como ocorre em províncias canadenses e estados americanos, ainda haverá restrição ao porte de bebida nas ruas. Carregar garrafas só será permitido em público com embalagens que escondam o rótulo”.

Pergunto: estamos caminhando a uma volta ao período da Lei Seca dos anos 1920 dos Estados Unidos, que fomentou a máfia? Até onde vai a hipocrisia dos que querem ver as diferenças e as liberdades individuais proscritas? Você terá que andar escondendo uma latinha de cerveja na praia e na rua como se fosse um criminoso? E de fato será, caro leitor, pois está claro que afrontar uma lei é crime.

A propósito da proibição do fumo, acho que, como já escrevi aqui, “a legislação promove a discriminação das pessoas, incentiva a delação, prejudica o comércio, é inconstitucional e fascista”. No caso da lei do nobre Campos Machado, envereda-se pelo caminho do fascismo com uma sem-cerimônia assustadora.


Livros

A sanha proibitiva e, no fundo, como digo, fascista, não vem só do que chamamos de direita política. O episódio contra a obra de Monteiro Lobato em 2010 já mostrou que a chamada esquerda também tem gosto pela proibição. E de livros. Outro fato, este recentíssimo relativo a obras literárias, mira agora um outro livro. O dicionário Houaiss.

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação na Justiça Federal em Uberlândia (MG) para tirar de circulação o dicionário, por discriminação ao povo cigano.

Ora, qualquer discriminação de cunho racista é abominável. Mas estamos falando de um dicionário, minha gente, pelo amor de Deus. O Houaiss registra várias acepções do termo cigano (como de qualquer outra etnia), entre as quais define expressamente como "pejorativa" esta: "aquele que trapaceia; velhaco, burlador".

O dicionário não está dizendo que o cigano é “velhaco”. Está dizendo que uma de suas acepções, “pejorativa”, é esta.

Concordo com o que diz Paulo Gurgel em seu blog EntreMentes: “o compromisso tácito” de “todo lexicógrafo que se preze” é o de “apresentar o repertório de significados atribuídos a cada palavra e indicar as particularidades de seu uso (‘informal’, ‘antiquado’, ‘chulo’, ‘regional’, etc.). Nosso douto procurador [Cléber Eustáquio Neves, que entrou com a ação contra o dicionário] deveria ter percebido que as informações apresentadas pelo Houaiss — que, desculpem lembrar a obviedade, não é uma enciclopédia — se referem ao termo, e não ao povo cigano. No dia em que registrar os valores depreciativos que certos vocábulos assumiram ao longo do tempo for considerado um crime, nossa língua — ou melhor, nossa civilização terá embarcado numa viagem sem volta para a noite escura da desmemória".

O caminho da proibição que se dissemina na sociedade brasileira – de fundo religioso, moralista, supostamente em prol da saúde ou em defesa do “direito das minorias”, seja qual for – é muito, muito preocupante. Já cansamos de ver na história (e não apenas no século XX) que esse é muitas vezes um caminho sem volta. Apoiado pela má-fé, por interesses obscuros e inconfessáveis ou pela ignorância.

PS: Logo após a publicação deste post, vi pelo twitter (por @ALuizCosta) que o Dicionário Houaiss divulgou release sobre sua posição a respeito do verbete "cigano", sugerindo uma solução para o problema em tais casos: "Registrar a palavra ou a acepção e dizer claramente, quando é o caso, que ela é pejorativa e preconceituosa". Íntegra aqui.

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