É importante difundir! Texto de Paulo Fonteles Filho sobre a intimidação que ele e outros cidadãos - que estão trabalhando no desvelamento dos crimes militares durante o regime militar - estão sofrendo. O texto foi postado no sítio Maria Frô em 7 de maio de 2011.
Por Paulo Fonteles Filho
Ontem, 5 de maio, circulou pelas redes sociais que teriam me assassinado em um bar, junto à minha mulher, em Belém.
A coisa foi tão contundente que jornalistas, amigos, foram até a casa de minha mãe, no bairro do Telégrafo, confirmar se eu havia mesmo sido morto. Houve ligações para o Ciop e até o Secretário de Segurança Pública do Pará, Luís Fernandes, fora acordado de madrugada para confirmar o ocorrido.
E a notícia parece que continua circulando. O Vítor Haôr, jornalista marabaense acaba de me ligar neste momento, às 13:42, perguntando se a macabra notícia era verdadeira. Falei com ele e disse que estava bem, e vivíssimo da silva.
Na alta madrugada, quando dormia candidamente ao lado de minha mulher, irmãos e primos quase derrubaram a porta de meu apartamento e ao me avistarem, sonolento, disseram que eu tinha morrido.
Quase morri mesmo, de susto.
O ocorrido poderia render boas gargalhadas, no futuro, se tal acontecimento não fosse de tanto mau-gosto e se a repercussão não tivesse chegado a tão longe: amigos em Macapá e até na distante Porto Alegre já estavam velando-nos.
Acontece que toda essa “papagaiada” tem endereço certo: continuar intimidando-nos.
Não apenas a mim, mas, sobretudo, o trabalho desenvolvido para desnudar os acontecimentos violentos praticados pelas forças de repressão da ditadura militar no combate ao movimento guerrilheiro do Araguaia.
Ontem, no dia de minha “morte”, passei toda a manhã e parte da tarde testemunhando num processo interno da Abin-Pa.
Tal processo versa, dentre outras coisas, sobre possíveis ocultações de cadáveres de desaparecidos políticos e destruição de documentos da ditadura por servidores da Abin-Pa. Tais servidores, Magno José Borges e Armando Souza Dias, são ex-militares, foram do Doi-Codi e atuaram na repressão à Guerrilha do Araguaia. Nos autos do processo quatro servidores da agência confirmam que ambos foram do famigerado Doi-Codi.
Um ex-mateiro daqueles sertões disse-me, à quinze dias atrás, que um tal de Capitão Magno, esse o nome verdadeiro, era quem cortava cabeças e mãos e estas eram enviadas à Belém, nos idos dos anos 70. Cabe dizer que Magno José Borges atualmente é vice-superintendente da Abin-Pa.
Essas denúncias não são novas.
Em 2001, como Vereador de Belém, fui a tribuna da Câmara Municipal tratar do assunto.
Em 2008, o “Diário do Pará”, através do jornalista Ismael Machado fez longa reportagem sobre o caso. Neste mesmo ano, representei ao Ministério Público Federal sobre a questão da Abin-Pa. Está tudo postado em meu blog sobre a chamada “A luta entre o velho e o novo na Abin”, em fevereiro deste ano de 2011.
Lá no Sul do Pará, em São Domingos do Araguaia, meus companheiros também foram acordados com a minha “morte”. Fico sabendo, através de contato telefônico, que no último sábado, 30 de Abril, houve uma reunião de ex-soldados que estão abrindo o que sabem sobre a guerrilha com o representante da direção nacional do PC do B, como eu, no Grupo de Trabalho Tocantins, Sezostrys Alves da Costa em Marabá. E que no dia da reunião, uma caminhonete de vidro fumê, novamente, andou rondando a casa deste companheiro em atitude suspeita.
Sezostrys diz, ainda, que mais pessoas estariam recebendo telefonemas anônimos.
O fato é que mais de dez pessoas estão sob ameaças das viúvas da ditadura militar.
Acontece que desde junho do ano passado temos denunciado a questão.
Tais ameaças já foram informadas ao Ministério da Defesa, ao Ministério da Justiça, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, através da Comissão de Mortos e Desaparecidos e à Policia Federal. Isso sem falar que a própria OAB nacional, onde fizemos reunião semana passada, também informada sobre tais acontecimentos.
A imprensa paraense e nacional já tratou de repercutir o assunto e o PCdoB já fez até nota pedindo providências.
O problema é que até agora nada aconteceu para apurar as coisas, nada, absolutamente nada.
O que causa espécie é que estamos participando de uma investigação federal, no estado democrático de direito, “por dentro” das instituições republicanas e as mesmas instituições, que dizem defender radicalmente à abertura dos arquivos e o achamento dos despojos de desaparecidos políticos, nada fazem para proteger-nos e, por fim, desbaratar os últimos bastiões da repressão política do país.
Se alguma coisa nos acontecer a responsabilidade deve ser, também, imputada à manifesta letargia com que o aparato estatal brasileiro têm tratado as denúncias, que há muito temos feito, sobre as ameaças aos trabalhos de descortinar nossos anos-de-chumbo.
Quem sou eu
- Aquiles Lazzarotto
- Bebedouro, São Paulo, Brazil
- Geólogo e professor aposentado, trabalho este espaço como se participasse da confecção de um imenso tapete persa. Cada blogueiro e cada sitiante vai fazendo o seu pedaço. A minha parte vai contando de mim e de como vejo as coisas. Quando me afasto para ver em perspectiva, aprendo mais de mim, com todas as partes juntas. Cada detalhe é parte de um todo que se reconstitui e se metamorfoseia a cada momento do fazer. Ver, rever, refletir, fazer, pensar, mudar, fazer diferente... Não necessariamente melhor, mas diferente, para refazer e rever e refletir e... Ninguém sabe para onde isso leva, mas sei que não estou parado e que não tenho medo de colaborar com umas quadrículas na tecedura desse multifacetado tapete de incontáveis parceiros tapeceiros mundo afora.
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