Anteontem (29), assistia eu ao Jornal da Record com Heródoto Barbeiro quando uma notícia foi dada com relação à saúde, informando que em um ano os brasileiros aportaram mais de 150 bilhões de reais para cobrir gastos com saúde (remédios, hospitais, planos de saúde privados etc.).
Aí vem o indefectível especialista para ser entrevistado. Um advogado de cujo nome não me lembro. A conversa gira em torno da regulamentação dos planos de saúde e, de passagem, são soltadas farpas na qualidade do atendimento da saúde pública face aos impostos que pagamos.
150 BILHÕES DE REAIS!!! Isso é quanto o brasileiro tira do próprio bolso para manter esse mercado muito bem aquecido. Ora, bolas! Como se falar em saúde pública quando saúde, que FOI direito de todos e constitucionalmente previsto, transformou-se definitivamente em MERCADORIA, nos anos de ouro do neoliberalismo. Mercadoria é algo para ser vendido e para gerar lucro para alguém. Esse mercado gerou grupos muito fortes - em termos financeiros e políticos. Grupos financeiramente fortes apoiam candidaturas e elegem políticos.
Se você, caro leitor, tivesse uma padaria, por acaso você apoiaria um candidato a prefeito que tivesse como proposta distribuir pão de boa qualidade gratuitamente para toda a população da sua cidade? Seria o fim do seu negócio e do seu lucro, não é mesmo? Ou você, enquanto um bom e experiente padeiro, iria trabalhar na Prefeitura, participando do processo da feitura dos bons pães a serem distribuídos ou então teria que procurar uma outra cidade onde essa "insanidade" não ocorresse. Ou seja, onde o pão continuasse a ser uma mercadoria a gerar lucros.
Se na sua cidade houvesse um hospital público com funcionamento modelar, atendimento rápido e desembaraçado, remédios de qualidade, equipes médicas confiáveis e bem remuneradas, acomodações limpas, agradáveis e bem cuidadas por zelosos servidores públicos (enfermeir@a, nutricionistas, pessoal de limpeza etc.), eu pergunto. Você desembolsaria a grana toda que atualmente desembolsa para manter e inflar essas entidades pouco transparentes e cheias de má vontade que oferecem Planos Privados de Saúde? Claro que não!
Mas os nossos "representantes" no legislativo e no executivo, eleitos com nossos votos, o foram também - e principalmente - graças ao apoio e às doações de campanha (sem nem falar em caixa 2) feitas, entre outros interessados, pelos empresários da áreas ligadas à mercadoria saúde (saúde privada, laboratórios farmacêuticos etc.).
Quando é que esses "nossos" representantes irão destinar as verbas adequadas e necessárias para dar qualidade de fato à saúde pública e gratuita? No Dia de São Nunca!
E ficam os pseudo-críticos na mídia fustigando o SUS! Nos intervalos dos programas aparecem propagandas de n medicamentos e de grandes e enternecedores planos de saúde, com imagens atraentes e qualidade de produção que mostra que excelentes agências de propaganda foram regiamente pagas para nos vender o medo de ficar doente e de envelhecer e, junto com o medo, a solução maravilhosa e luminosa contida na MERCADORIA deles: a nossa saúde.
Qual emissora ou jornal será de fato crítico com o cerne da questão? Isso desnudaria seus patrocinadores. Eles perderiam contratos comerciais que garantem sua sobrevivência econômica. Então, armam uma cara-dura, naturalizam a "sacanagem". Se você quer um determinado produto com qualidade tem que pagar por ele. É "natural"! Se você é pobre, o que fazer? Dane-se! O mundo não é para os cidadãos, mas sim para os consumidores.
Intencionalmente, todos se esquecem de que todo cidadão paga impostos. Isso é pagar! E, ironicamente, aqueles mais mal servidos pelos serviços públicos básicos são aqueles que, proporcionalmente, pagam impostos mais escorchantes. É só nos lembrarmos de que quando alguém compra uma caixa de fósforos paga, ali, no ato, toda a cadeia de impostos da cadeia de produção do fósforo, desde a derrubada da árvore, da extração dos minérios necessários à feitura da cabeça do fósforo, até a saída da caixa de fósforo pronta da fábrica. E mais os lucros de todos os envolvidos nessa cadeia.
Nos discursos da mídia (imprensa em geral, novelas, análise de "especialistas" em bancadas de jornais, entrevistas etc.), os direitos do cidadão foram, há anos, sendo trocado gradual e meticulosamente pelos direitos do consumidor. Houve e há intencionalidade nisso tudo. E mesmo esses decantados direitos do consumidor não são lá muito respeitados pelo empresariado. Os direitos do cidadão já foram para a lata do lixo, tendo sido estrategicamente retirados do imaginário popular.
O mesmo raciocínio aplica-se para a EDUCAÇÃO e para a SEGURANÇA. Também FORAM direitos do cidadão, constitucionalmente previstos. Também viraram MERCADORIA. Pode procurar a dedo, que você não vai encontrar nenhum, NENHUM político que defende seriamente a oferta de educação, saúde e segurança públicas, gratuitas e de qualidade.
Os interesses econômicos contrariados seriam muitos. O político que ousar caminhar nessa direção terá vida política curta, efêmera. Isso quando não tiver sua reputação assassinada por uma imprensa marrom que desencadeia processos de arrasa-quarteirão sobre quem vai contra os interesses do patrão.
Para terminar, eu apresento uma proposta pessoal: EU PROPONHO TRANSFERIR/DEPOSITAR PARA O ERÁRIO PÚBLICO TUDO O QUE ATUALMENTE GASTO COM A MERCADORIA SAÚDE (incluindo, é claro, as mensalidades do plano de saúde) se eu pudesse confiar que esse recurso - junto ao de muitos outros brasileiros que sei que fariam isso de coração aberto - seria utilizado para a oferta de SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE COM QUALIDADE PARA TODOS, INDISTINTAMENTE. E faria isso sem exigir, em troca, qualquer privilégio, qualquer tratamento diferenciado daquele dado a todos os cidadãos. Aí, sim, todos juntos formaríamos uma grande massa de pressão e controle do atendimento de saúde dispensado à nossa população. Em suma, meu desejo é o de que a saúde seja completamente estatizada, e para isso eu pagaria mais, com muita satisfação.
Quem sou eu
- Aquiles Lazzarotto
- Bebedouro, São Paulo, Brazil
- Geólogo e professor aposentado, trabalho este espaço como se participasse da confecção de um imenso tapete persa. Cada blogueiro e cada sitiante vai fazendo o seu pedaço. A minha parte vai contando de mim e de como vejo as coisas. Quando me afasto para ver em perspectiva, aprendo mais de mim, com todas as partes juntas. Cada detalhe é parte de um todo que se reconstitui e se metamorfoseia a cada momento do fazer. Ver, rever, refletir, fazer, pensar, mudar, fazer diferente... Não necessariamente melhor, mas diferente, para refazer e rever e refletir e... Ninguém sabe para onde isso leva, mas sei que não estou parado e que não tenho medo de colaborar com umas quadrículas na tecedura desse multifacetado tapete de incontáveis parceiros tapeceiros mundo afora.
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