- Atira! Atira! – lhe dizia o índio Parakanã, apontando a caça. O antropólogo Carlos Fausto, com a arma na mão, olhava na direção indicada e não via bulhufas. Só árvores.
- Ali, ali, naquele galho – suplicava em voz baixa o índio, sinalizando o alvo com o dedo.
- Onde? Onde? – perguntava o antropólogo, atônito. Via apenas uma mancha verde formada por um emaranhado de troncos, folhas, cipós, raízes, musgos, liquens, sombras, tudo da mesma cor, mas nem sinal do animal. O bicho, que para ele continuava invisível, aproveitou a hesitação e se escafedeu, sem nem ao menos declinar sua identidade ao ofuscado caçador.
Foi ali, naquele momento, que Carlos Fausto, sem disparar um tiro, acertou o que não viu, ao suspeitar que seus olhos estivessem incapacitados de ver, dentro da floresta, aquilo que os índios viam. Estávamos no final da década de 1980, ele começava seu mestrado em Antropologia Social com os índios Parakanã, orientado por Eduardo Viveiros de Castro e não era, ainda, capaz de ler a floresta.
Veja o texto na íntegra no sítio (Taqui pra ti), do professor José Ribamar Bessa Freire. Trata-se de crônica relacionada à tese de doutorado defendida pela ortoptista Vivian Secin intitulada Ortóptica, oralidade e letramento: a visão binocular dos indígenas Guarani Mbya da Aldeia Sapukai (RJ) no Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ.
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