Asa branca (Luiz Gonzaga / Humberto Teixeira)
Orquestra Armorial
Orquestra Armorial
Um dia a paciência e a complacência populares teria que se acabar. A expoliação do mundo do trabalho está chegando a extremos até que previsíveis, ante a desregulação dos mercados e agentes financeiros mundo afora.
As condições estão dadas, e os povos estão saindo às ruas para dizerem em alto e bom som que não as aceitam. Agora vamos ver qual o limite das autoridades do primeiro mundo frente a essas manifestações.
É muito fácil exigir dos países do norte da África que tenham cuidado com suas populações civis. Espertamente, esse foi o argumento utilizado - proteger vidas de civis - para o "bloqueio aéreo" da Líbia. Muito mais do que um bloqueio aéreo, o que está ocorrendo são ataques massivos a alvos os mais diversos, que incluem muitas vítimas civis, exatamente aquelas que "justificaram" o pseudo bloqueio aéreo.
Como reagirão Londres, Tel-Aviv, Madrid, Roma, Lisboa, Santiago etc. perante a ação de seus cidadãos exigindo mais igualdade e melhor divisão de riquezas, além de qualidade de vida com saúde e educação?
Sinceramente, não acho difícil que algum evento de grande magnitude seja forjado para forçar esse povo a correr para casa, com medo. Pode ser um "ataque terrorista", uma guerra contra o Irã, com o consequente risco de polarização entre ocidente e oriente. Há, certamente, nas mãos dos políticos, financistas e da indústria bélica, um saco de maldades que tanto a CIA quanto o M16 ou o Mossad podem utilizar subrepticiamente, de modo a calar os insatisfeitos.
Ou, por último, e talvez não necessariamente no fim, há a possibilidade de reprimir violentamente os insatisfeitos. Repressão a bala mesmo.
Esses são os termos do limite a que o capitalismo pode chegar (e até ultrapassar) para manter o seu status quo de acumulação de riquezas. Tudo que se contrapuser ao avanço do capital é considerado inimigo, ou, no jargão da desqualificação, terrorismo.
No sítio Carta Maior está postado o texto abaixo, à guiza de editorial, e atrevo-me a reproduzi-lo aqui, e peço à publicação a devida vênia, pois compartilhamos das mesmas e pesadas preocupações com o futuro e com o bem-estar dos homens. Sem esquecer que agora, neste momento, milhões de cidadãos africanos passam fome. Alguém já experimentou ficar uns três dias sem comer? Imagine o que é a perspectiva de ficar sem comer por prazo indeterminado, à mercê de auxílios que podem ou não vir de algumas partes do mundo.
Três dias que abalaram o mundo
Segunda- feira, 7 de agosto, Londres: distúrbios sociais iniciados nos subúrbios pobres transformam-se em explosão viral que envolve milhares de jovens em diferentes pontos do país.
Terça-feira, 8 de agosto, Santiago: 150 mil estudantes vão às ruas em defesa de uma reforma educacional que universalize o ensino público, gratuito, de qualidade.
O que interliga esses levantes quase sincronizados em lugares tão díspares, antecedidos de rebeliões massivas que irromperam como que abruptamente das areias dos países árabes da modorra social em outras partes do mundo? A mera coincidência do calendário? Certamente não.
A resposta mais próxima talvez tenha que ser buscada na percepção difusa mas crescente, enraivecida em alguns casos, consciente em outros, da brutal desigualdade herdada do ciclo de supremacia das finanças desreguladas - ciclo dos bancos, o dos endinheirados, das corporações invisíveis e ubíquas ao mesmo tempo.
Sejam quais forem as denominações sedimentadas no discernimento popular elas guardam aderência com intolerável espiral de privilégio que consolidou duas humanidades socialmente imiscíveis nas últimas décadas.
Em quase todos os países, na maioria das grandes cidades, derrama-se, de um lado, a riqueza num grau de ostentação jamais registrado na história; de outro, o bem-estar social sua contrapartida em subjetividade, dissolvem-se em sucessivas ondas de saque, desregulamentação e delinquência institucional contra o patrimônio público, os direitos, certezas e valores que enlaçam a convivência compartilhada.
No crepúsculo turbulento do ciclo, a ganância em fuga ameaça agora esfarelar os últimos centímetros de chão firme de vidas expostas às intempéries de toda sorte; e a tal ponto encurraladas por dentro e por fora em sua precariedade estrutural só lhes resta uma fresta: as ruas.
CartaMaior, 12 de agosto de 2011.
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