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Geólogo e professor aposentado, trabalho este espaço como se participasse da confecção de um imenso tapete persa. Cada blogueiro e cada sitiante vai fazendo o seu pedaço. A minha parte vai contando de mim e de como vejo as coisas. Quando me afasto para ver em perspectiva, aprendo mais de mim, com todas as partes juntas. Cada detalhe é parte de um todo que se reconstitui e se metamorfoseia a cada momento do fazer. Ver, rever, refletir, fazer, pensar, mudar, fazer diferente... Não necessariamente melhor, mas diferente, para refazer e rever e refletir e... Ninguém sabe para onde isso leva, mas sei que não estou parado e que não tenho medo de colaborar com umas quadrículas na tecedura desse multifacetado tapete de incontáveis parceiros tapeceiros mundo afora.

sábado, 23 de abril de 2011

Universidade: cotas da igualdade (23abr2011)

Em minha experiência docente na universidade, percebi algumas coisas (ainda bem!). Sou professor numa área que se identifica mais com formação técnica, em que meus pares não tiveram (assim como eu não tive por muito tempo) qualquer formação para serem educadores. Apesar de ter feito mestrado em Educação, fico "cheio de dedos" para escrever sobre isso, pois na globosfera há muitos craques da área.

Mas já está chegando a hora de eu me manifestar, passando do limite a que me ative até agora de reproduzir postagens de outros blogs e sítios que considero importante que meus parcos e muito bem-vindos leitores conheçam.

Sou um fugitivo da grande mídia. Não acredito nela. Os interesses que estão por trás dela são contrários àqueles que entendo como de verdadeiro interesse público.

A universidade se utiliza de discurso e valores que são mais próximos aos do jovem proveniente das classes média e alta.

Há uma possibilidade de os professores enxergarem maior potencial naqueles alunos que mais se assemelham aos jovens que participam de sua vida pessoal, familiar ou de seu grupo de amizades. Seja pelo comportamento, pelo vestuário, e, mais fortemente, por usufruírem de bens culturais semelhantes (acesso a cinema, teatro, literatura, meios de informação...).

O aluno que provém do ensino básico público, que enfrentou diversas agruras para chegar à universidade, e que não dispõe de amplo acesso a esses mesmos bens culturais, podem se deparar com um abismo entre sua linguagem e aquela que se usa na universidade. Quando falo em linguagem não me refiro somente à fala, mas às mais diversas formas de sua manifestação.

Muitos caem nesse abismo. Acabam por abandonar os estudos, sentindo-se derrotados e incompetentes, na maioria dos casos. No entanto, o que pode ter acontecido é que a universidade não lançou as pontes para a travessia desse abismo, por não enxergar o potencial efetivo desse aluno lutador, excluindo-o por ser diferente dos jovens "educados" e "bem comportados" com os quais a maioria dos professores está habituada a lidar fora da universidade.

Aqueles que resistem a esse momento de desânimo inicial, a essa sensação de não pertencimento a esse meio etc., já conseguem um outro grande feito: além de entraram na univesidade, conseguem se inserir entre seus pares.

No geral, esses são alunos criativos, que compensam a falta de um cabedal cultural prévio, trabalham por conhecer, entender e, a melhor de suas características, dão conta de resolver problemas novos que lhes surgem com mais desenvoltura do que os "mais bem formados". A escola pública, com suas peculiaridades que todos conhecemos, acaba fazendo com que ele tenha que lutar por tudo, criando alternativas que lhe permitam a sobrevivência intelectual. São alunos que se entregam de corpo e alma aos trabalhos próprios de bolsas de iniciação científica, quando as conseguem. Eles valorizam cada dia vivido no ambiente universitário. Tendem a ser mais cooperativos do que competitivos.

Sei que há algumas generalizações no que afirmo, mas quando estou escrevendo, neste exato momento, tenho uma boa quantidade de estudantes em mente cujas trajetórias confirmam esse meu ponto de vista. Eles são profissionais respeitados não só por sua capacidade profissional, mas também pelo modo como lidam com seus estagiários e suas equipes de trabalho.

É certo que outros profissionais com trajetórias diferentes, que tiveram uma base cultural familiar mais ampla também chegam lá.

Por fim, entendo que a convivência entre esses alunos de diferentes procedências - regionais, culturais, educacionais etc. - seja parte fundamental da formação universitária, no desenvolvimento da tolerância e da boa convivência. Do desenvolvimento da compreensão de que cada um contribui com o coletivo com aquilo que traz de sua vida pretérita, aportando para o ambiente universitário uma legítima representatividade dos diferentes segmentos da sociedade.

O valor da diversidade é inestimável. Precisamos estar atentos a ela para não banirmos da universidade quem é diferente. Isso sem falar em raciscmo, homofobia etc. etc., assuntos que necessariamente fazem parte desse raciocínio se tomado em termos mais amplos.

Já para o estudante pobre e negro, aquele abismo inicial de que falei anteriormente, quando do ingresso na universidade, se amplia brutalmente, porque o racismo muitas vezes está imerso em nossas linguagens. Maquiado, mas presente. A sociedade "branca" - em sua maioria mestiça, a bem da verdade - designa ao negro papéis sociais menores. Esse imaginário é poderosa e oprime o jovem negro que não quer aceitar, e não deve aceitar, ser empurrado a ocupar esses espaços que a sociedade destina a eles.
Se o adolescente branco tem como desafio vencer a pobreza para passar no vestibular, o adolescente negro, além da pobreza, precisará vencer o preconceito. Precisará ir além da expectativa social que lhe atribuiu um lugar na sociedade que ele não quer ocupar. E isso, muitas vezes, é bem mais difícil do que simplesmente aprender a matéria que cai na prova. (Túlio Vianna)
Essas reflexões emergiram a partir da leitura de um artigo de Túlio Vianna disponível no sítio da Revista Fórum em que o autor discute a questão das cotas nas universidades.

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